BLOQUEIOS

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BLOQUEIOS


Márcia Vetromilla Fuentes

Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC)

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)


1. Introdução

A circulação atmosférica de latitudes médias é caracterizada predominantemente por um escoamento zonal, com deslocamento para leste de frentes, ciclones e anticiclones. No entanto, em condições de bloqueio, a presença de um anticiclone quase estacionário de grande amplitude interrompe a progressão normal dos sistemas para leste. A característica da circulação atmosférica associada à situação de bloqueio é a divisão do jato em dois ramos, que ocasiona um rompimento do padrão zonal. Na situação de bloqueio um anticiclone se forma em latitudes mais altas do que aquelas onde se localiza a alta subtropical e é freqüentemente acompanhado por uma baixa fria em baixas latitudes. Nesta situação deve-se esperar, naturalmente, um escoamento mais meridional onde os sistemas transientes de leste, como cavados e anticiclones, são desviados de suas trajetórias. Assim, as baixas migratórias ao se aproximarem de uma alta de bloqueio ficam estacionárias ou deslocam-se na periferia da alta, podendo causar condições de tempo duradouras sobre grandes áreas (Sanders, 1953).

Devido à natureza persistente, uma vez estabelecido um bloqueio, as condições de tempo associadas podem perdurar por vários dias, de forma que a previsão de tempo para algumas regiões podem ter um maior grau de confiabilidade e serem estendidas. Isto representa grandes benefícios a vários setores, por exemplo, agrícola, industrial, energético, transportes e outros, cujo planejamento e gerenciamento dependem do tempo. Motivados com a possibilidade de melhorar e estender o prazo da previsão de tempo e pelo desafio de se estabelecer uma teoria única que explique a formação, manutenção e dissipação de um fenômeno de bloqueio, diversos pesquisadores o têm estudado. O primeiro a documentar um bloqueio na atmosfera foi Garriot em 1904 (Lejenas and Okland,1983).

Sanders (1953) cita algumas características de ação de bloqueios. Ele afirma que o deslocamento das altas de bloqueio é relativamente lento de um dia para o outro e uma vez que a alta de bloqueio tenha sido estabelecida, ela persiste por vários dias. No seu estágio de dissipação, a pressão cai lentamente. Este processo lento, se identificado suficientemente cedo, pode fornecer subsídio à previsão, em virtude da persistência das condições de tempo. Treidl et al (1981), mencionam que normalmente as altas de bloqueio têm movimento lento ou estacionam-se, podendo às vezes até retroceder. Lejenas (1984) notou que a maioria dos bloqueios do Hemisfério Sul têm deslocamento para leste e apenas os de duração mais longa movem-se para oeste. Elliot and Smith (1949), observaram que na região da alta em superfície, a pressão e a temperatura permanecem acima do normal, enquanto na estratosfera a pressão fica acima e a temperatura abaixo do normal.

Vários trabalhos (Van Loon,1956; Casarin, 1983; Lejenas, 1984; Trenberth, 1986; Kayano e Kousky, 1989) mostram que no Hemisfério Sul existe uma região preferencial de bloqueio na região da Austrália-Nova Zelândia e duas outras, cujas frequências de ocorrência do fenômeno são menores: uma no Oceano Atlântico, a leste da América do Sul e outra no Oceano Índico a sudeste da África. Sinclair (1996) e Marques (1996), usando uma série maior de dados, encontraram uma outra região favorável à ocorrência de bloqueios que localiza-se à sudeste do Oceano Pacifico, próximo à costa oeste da América do Sul. Estes bloqueios, assim como os da região da América do Sul, têm grande influência sobre as condições de tempo na América Latina

2. Definições de Bloqueio

Assim como não existe uma teoria única para explicar a formação, manutenção e decaimento do fenômeno de bloqueio, também não existe uma definição exata de bloqueio (Lejenas and Okland, 1983). Neste sentido descreveremos algumas das características e definições encontradas na literatura. Vários autores têm enunciado definições para caracterizar situações de bloqueio. Muitos dos trabalhos sobre bloqueio são para o Hemisfério Norte (Elliot and Smith, 1949; Rex, 1950a; Lejenas and Okland, 1983 e outros), nos quais são encontradas diferentes definições.

Segundo Lejenas e Okland (1983), a melhor definição de bloqueio é o critério de Rex (1950a). De acordo com este critério o escoamento nos altos níveis, que caracteriza um bloqueio deve satisfazer:

a) a corrente zonal básica de oeste deve bifurcar, formando dois ramos;

b) cada ramo deve transportar uma quantidade apreciável de massa;

c) o sistema de jato duplo deve se estender no mínimo por 45 de longitude;

d) uma rápida transição do fluxo zonal de oeste a montante para um do tipo meridional a jusante, precisa ser observado na bifurcação do escoamento;

e) este padrão deve persistir, com reconhecida continuidade por pelo menos dez dias.

O bloqueio é dito iniciar quando a característica (a) for cumprida, e é dito dissipado quando uma das características (a), (b), (c), ou (d), não for satisfeita. Até hoje, este critério é considerado o melhor, porém ele descreve bloqueios de grande duração e não capta os de curta duração. Assim, critérios menos rígidos, especialmente no que se refere à duração do evento, têm sido adotados (Lejenas and Okland, 1983).

Devido à dificuldade da utilização das definições de bloqueio, num programa computacional são usados alguns índices que permitem mais facilmente indicar a ocorrência de bloqueio. Dentre os índices existentes, o mais encontrado na literatura é o índice zonal. Lejenas (1984) definiu bloqueio, para o Hemisfério Sul, empregando a metodologia de Índice Zonal. Definindo o Índice Zonal como sendo:

I() = Z35S() - Z50S() H.S.

onde: I é o Índice Zonal

é a longitude

Z é a altura geopotencial

As condições impostas para ter-se a difluência no escoamento é que I () seja negativo, no entanto como os bloqueios possuem uma certa extensão latitudinal eles fizeram a média do índice em três longitudes subsequentes. Para se ter o bloqueio é necessário que:

I()0

I(-10) + () + (+10)/3 0

indicando o núcleo frio do mesmo.

3. Variação Sazonal e Anual dos Bloqueios no Hemisfério Sul.

Van Loon (1956) no seu estudo para o Hemisfério Sul observou comportamento semelhante entre os casos do Oceano Atlântico e Pacífico. Ele encontrou um máximo de freqüência no fim do inverno e início da primavera, e um máximo secundário no outono. Também, notou mínimos de ocorrência de bloqueio nos Oceanos Atlântico e Pacífico no fim da primavera, verão e meados de inverno. O máximo de outono no Oceano Índico é maior que o máximo que vai do final do inverno até o início da primavera.

Casarin (1983) no seu estudo para o Hemisfério Sul considerando regiões isoladas na região da Austrália encontrou uma forte tendência para a ocorrência de bloqueio no fim do outono e parte do inverno (meses de maio a julho). A leste da Austrália e na região entre 175W -125W ele notou uma tendência para a ocorrência de bloqueios no verão e na região a oeste da Austrália na primavera. Para a América do Sul a estação com maior ocorrência é o outono .

Trenberth and Mo (1985) encontrou a maior freqüência, para a região da Nova Zelândia e Austrália, entre agosto e setembro. Esta maior freqüência de bloqueios no período de inverno, nesta região da Austrália, deve-se, segundo Mo (1983), as grandes amplitudes de onda três e quatro, mais persistentes nesta estação do ano. Wright (1974) estudando os fenômenos de bloqueio na região da Austrália, através de cartas sinóticas ao nível do mar e 500 hPa, encontrou um máximo de ocorrência, nos períodos de maio a julho.

Kayano e Kousky (1989) apresentaram uma notável variação entre as estações, no oeste do oceano Pacífico e região da Austrália. Eles salientam que a freqüência de bloqueio é menor durante a primavera no leste do Pacífico Sul, e existe uma clara indicação de variação sazonal com um máximo de atividade de bloqueio ocorrendo nos meses de inverno. Estes autores analisaram o período de 1979 a 1985 e, focalizando a região do Pacífico, em anos individuais, observaram freqüência máxima de bloqueio no ano de 1981. Eles notaram que a menor freqüência de bloqueio foi no ano de 1982. Eles observaram que no ano de 1983, ano de forte episódio de El Ninõ-Oscilação Sul sobre o leste equatorial do Pacífico, houve uma baixa atividade de bloqueio no Pacífico. Devido a este fato eles sugerem que a ocorrência de bloqueio teria uma forte ligação com fatores climatológicos da circulação atmosférica.

4. Persistência das Situações de Bloqueio

Rex (1950b) analisou a persistência das situações de bloqueio nas regiões do Atlântico e Pacífico Norte. Ele notou que a persistência para estes oceanos pode variar de 10 a 41 dias. Para o setor Atlântico a duração média calculada por ele, para 82 casos, foi de 16,6 dias. Para o setor Pacífico a duração média calculada foi de 12 dias. Rex concluiu que, embora casos com duração menor que dez dias possam ocorrer no Hemisfério Norte, a duração mais provável fica entre 12 e 16 dias.

Van Loon (1956) estudando a persistência de bloqueios para o Hemisfério Sul encontrou que a duração mais provável parece estar entre 6 e 10 dias. Ele observou a duração média de 9,5 dias em casos de bloqueio no Pacífico, de 8,5 dias no Atlântico e de 8 dias no Índico.

Casarin (1983) no seu estudo para o Hemisfério Sul, no período entre 1975 a 1979, mostrou que o bloqueio mais longo ocorrido foi de 26 dias, no Oceano Pacífico, enquanto, a média de duração dos bloqueios é de 9,1 dias. Ele notou que bloqueios mais persistentes no Hemisfério Sul encontram-se no Oceano Pacífico com duração média de 11,3 dias. Os bloqueios sobre a América do Sul e sua costa leste persistem, em média 7,9 e 8,1 dias, respectivamente.

Muitos pesquisadores têm estudado os possíveis mecanismos responsáveis pela formação, manutenção e dissipação dos bloqueios. No entanto, devido à complexidade do fenômeno, não há, até o presente momento, uma teoria única que explique esta questão. A grande maioria das tentativas para explicar o fenômeno estão direcionadas para o Hemisfério Norte, porém nos casos do Hemisfério Sul percebe-se grandes diferenças quanto às localizações, influências orográficas e outros fatores. Inúmeras teorias propostas para a formação, manutenção e dissipação dos bloqueios são resumidas em Baines (1983).


BLOQUEIO ATMOSFÉRICO NO HEMISFÉRIO SUL DURANTE O PERÍODO DE 1980 A 1993

Rosa de Fátima Cruz Marques e V. B. Rao

Departamento de Ciências Meteorológicas (DCM)

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)


1-Introdução

O fenômeno bloqueio tem um importante papel na variabilidade atmosférica de baixa freqüência, assim, a compreensão dos mecanismos que o originam e o mantém são de grande importância para o sucesso da previsão de curto, médio e longo prazos. Estudos observacionais, teóricos e de modelagem númerica, têm sido realizados para melhorar essas previsões. Além dos trabalhos citados na seção anterior, Taljaard (1972) fez uma descrição das características sinóticas do anticiclone de bloqueio para o HS. Coughlan (1983) comparou este fenômeno nos dois hemisfério. Lejenäs (1984), utilizou 8 anos (24/04/1972 a 30/11/1980) de altura geopotencial em 500hPa, analisou as principais áreas de formação e discutiu as regiões preferidas para a formação deste fenômeno. Trenberth e Mo (1985) utilizaram dados de maio de 1972 a novembro de 1980 para estudar bloqueios atmosféricos, e encontraram a maior ocorrência de situações de bloqueios na região da Nova Zelândia. Sugerem que essa predominância de atuação de bloqueios é devida ao aumento local da bifurcação climatológica do vento de oeste nesta região. Há formação de bloqueios também nos Oceanos Atlântico e Índico. Sinclair (1996), utilizou 10 anos de dados do ECMWF (1980-1989) para localizar bloqueios no HS. Os bloqueios foram identificados como centros de alta pressão persistentes com o centro excedendo 20 hPa. Nesse estudo os bloqueios mais intensos e de longa duração ocorreram em duas regiões do Oceano Pacífico, no sul da Nova Zelândia e sudoeste da América do Sul.

Nesta análise da ocorrência de bloqueios no período de 1980 a 1993, serão apresentadas as variações sazonais e interanuais, com a utilização de dados do ECMWF e a metodologia desenvolvida por Lejenäs e Okland (1983) e Lejenäs (1984). É também feita uma análise das características da atmosfera relevantes ao fenômeno de bloqueio.

2- Variação sasonal

A Figura 1 apresenta a freqüência de bloqueios em função da longitude, no período estudado (1980-1993). As regiões de máxima ocorrência de bloqueios são: a região da Austrália e Nova Zelândia (140W a 140E), o sudeste do Oceano Pacífico (80oW a 120oW), o Oceano Atlântico (sudeste da América do Sul) e o Oceano Índico (sudeste da África). Exceto a região do sudeste do Oceano Pacífico, as outras três regiões são conhecidas como locais predominantes para atuação de bloqueios (Van Loon, 1956; Lejenäs, 1984). O sudeste do Oceano Pacífico é uma região detectada neste estudo de formação de bloqueios, a qual foi também encontrada por Sinclair (1996), mesmo este tendo utilizado um método diferente para localizar bloqueios. A região situada a leste da Nova Zelândia é o local predominante para a atuação de bloqueio, apresentando o máximo em 180 de longitude.

A Figura 2 apresenta a variação sazonal de freqüência de bloqueios. Quanto à ocorrência de bloqueio, os resultados obtidos mostram que o inverno ( Figura 2c ), é a estação do ano com maior freqüência de bloqueio, e o verão ( Figura 2a ) a de menor. A região sudeste do Oceano Pacífico e o Oceano Atlântico (70W a 10E), alcançaram as maiores freqüências de bloqueio nas estações de inverno e primavera ( Figura 2c e Figura 2d , respectivamente). No Oceano Índico (20E a 100E), não notou-se predominância sazonal e a freqüência manteve-se relativamente pequena nas quatro estações do ano. No outono e na primavera ( Figura 2b e Figura 2d , respectivamente), também encontrou-se freqüências de bloqueio elevadas, na região em torno de 180 de longitude. Entretanto, no inverno, a área de maior atuação dos bloqueios no Oceano Pacífico abrange uma maior extensão longitudinal (130E a 130W). Os bloqueios mais intensos e duradouros no inverno foram identificados na região da Austrália e Nova Zelândia.

A Figura 3a e Figura 3d apresentam a variação de um mês para o outro da freqüência de bloqueios para todo o globo e para os Oceanos Pacífico, Atlântico e Índico, respectivamente. Observa-se na Figura 3a que junho foi o mês com maiores ocorrências de bloqueios, seguido pelos meses de julho e setembro. No Oceano Pacífico (110oE a 80oW) (Figura 3b ), encontrou-se o máximo de freqüência de junho a agosto, um máximo secundário em março e o mínimo em janeiro e fevereiro. Com freqüências bem menores, os Oceanos Atlântico e Índico, apresentam as maiores ocorrências de bloqueios nos meses de setembro e em maio ( Figura 3c e Figura 3d , respectivamente). Estes resultados concordam qualitativamente com os de Lejenäs (comparar as Figuras 3 do presente trabalho com a Figura 4 de Lejenäs), embora a diferença resida na quantidade, pois como já mencionado, Lejenäs utilizou o número de dias bloqueados, e não o número de bloqueios no cálculo da freqüência.

3-Variação Interanual de Freqüência de Bloqueios

Neste ítem apresentam-se as variações interanuais da ocorrência de bloqueios, com especial interesse na eventual redução ou aumento de situações de bloqueios em anos caracterizados pelos fenômenos El Niño e La Niña.

Dentre os 14 anos de dados inspecionados, os anos de 1983, 1987 e 1990/95, foram anos em que ocorreu o fenômeno El Niño. Cada registro de ocorrência deste fenômeno possui suas peculiaridades. O El Niño de 1983 foi considerado na literatura como anômalo por sua intensidade, efeitos climáticos globais, e também por seu desenvolvimento inicial anormal (Rasmusson and Wallace, 1983). O El Niño de 1987 foi considerado moderado. O terceiro El Niño registrado no período estudado, foi o de 1990 a 1995 (Trenberth e Hoar, 1996), o qual consta na literatura como um El Niño bastante irregular, e o mais longo da história.

Sobre o fenômeno La Niña, sua caracterização é pelo resfriamento das águas do Pacífico leste, na região Equatorial (Halpert e Ropelewski, 1992). A ocorrência desse fenômeno foi registrada em 1984/1985 e em 1988/1989 no período estudado.

A Figura 4 apresenta a variação de freqüência de bloqueios em função da longitude para o globo e para cada oceano separadamente. A análise da Figura 4a mostra claramente uma grande variação interanual, ressaltando os anos de 1984 e de 1985 com as maiores freqüências de bloqueio, seguidos pelos anos de 1991 e 1992. Em 1990, encontrou-se a menor incidência de bloqueios. No Oceano Pacífico ( Figura 4b ), a configuração da curva de freqüências de bloqueios assemelha-se à Figura 4a , devido a predominância bastante acentuada de formação de bloqueios neste oceano em relação aos Oceanos Atlântico e Índico. Entretanto, os anos com máxima freqüência de bloqueio no Oceano Pacífico foram 1984 e 1992. No Oceano Atlântico ( Figura 4c ), observa-se que não houve registro de situações de bloqueios em 1982, ocorrendo o máximo nos anos de 1983 a 1986, e um mínimo em 1987. Em 1990 não houve registro de formação deste fenômeno. O ano de maior freqüência de bloqueios no Oceano Índico ( Figura 4d ) foi 1986 seguido pelos anos de 1983, de 1985 e de 1991. Ressalta-se que as variações interanuais são dominantes no Oceano Pacífico e menores nos Oceanos Atlântico e Índico. Na Figura 4a , pode-se observar que as menores freqüências ocorreram em 1980, 1982-1983, 1988, 1990 e 1993; e as maiores ocorreram em 1984-1986 e 1991-1992.

A Figura 5 mostra a freqüência de bloqueios para cada ano. Esta Figura sugere que a variação longitudinal é diferente de um ano para outro, embora a região de máxima ocorrência de bloqueios ocorra na região da Austrália e Nova Zelândia em todos os anos. A menor freqüência de bloqueio no HS ocorreu no ano de 1990. Nota-se que, de um modo geral, há uma diminuição de bloqueios durante os anos em que ocorreram o El Niño, e uma elevada freqüência de bloqueios durante os anos em que houve o fenômeno La Niña, na região de maior ocorrência deste fenômeno (leste da Austrália).

A Figura 6 ressalta a diferença relativa em anos de El Niño e anos de La Niña, considerando-se a freqüência de bloqueios. Esta figura mostra a freqüência média de bloqueios para os três anos de El Niño (1983, 1987 e 1990) e os três anos La Niña (1984, 1985 e 1989). A análise dessa Figura mostra que a freqüência de bloqueios nos anos de La Niña é maior do que aquela nos anos de El Niño. Na região em que há a maior concentração de bloqueios, em torno de 180, o valor de freqüência nos anos de La Niña é superior ao dôbro da freqüência nos anos de El Niño. O segundo máximo, próximo à costa oeste da América do Sul, não se observa mudanças da freqüência entre estes dois períodos. Na região do Oceano Índico há um aumento na freqüência de bloqueios durante os anos de El Niño em relação aos anos de La Niña. Entretanto, a diferença mais acentuada entre estes dois períodos é na região da Austrália e Nova Zelândia.

4-Características da atmosfera relevantes ao fenômeno bloqueio.

a) Vento Zonal

A Figura 7 e Figura 8 apresentam a distribuição climatológica do vento zonal no verão e inverno do HS, respectivamente. Observa-se que nas regiões dos Oceanos Atlântico e Índico o vento zonal é aproximadamente constante. O vento mais forte nessa região (45oS-50oS), não varia de intensidade do verão para o inverno ( Figura 7 e Figura 8, respectivamente), entretanto, no Oceano Pacífico ocorrem as maiores mudanças de intensidade do vento zonal de uma estação para outra.

Segundo Trenberth (1982), esta mudança de comportamento do vento zonal na região do Oceano Pacífico está associada ao desenvolvimento do jato subtropical no inverno, que atinge velocidades superiores a 50 ms-1 em 200 hPa. A Figura 8 apresenta a climatologia do vento zonal de inverno em 14 anos de dados. Observa-se que nas latitudes médias do HS, os ventos mais fracos são encontrados na região da Nova Zelândia, com uma bifurcação do jato de oeste no sul da Austrália. Portanto, enfatiza-se que a característica climatologica do vento zonal é um dos mecanismos mais importantes quanto à predominância dos bloqueios no sudeste da Austrália na estação do inverno. Assim, perto da Nova Zelândia, região onde há a existência dos dois jatos, é favorecida a formação de bloqueios (Van Loon, 1964; Palmén and Newton, 1969; Trenberth, 1984).

As Figura 9a e Figura 9b mostram a distribuição média do vento zonal no inverno, em três anos de El Niño e em três anos de La Niña, respectivamente. Observa-se a configuração de uma espiral em ambos os períodos, e a existência, nas mesmas longitudes, do jato polar e jato subtropical, o que não é observado em anos de El Niño. A existência dos dois jatos em torno de 180  de longitude é claramente observada em anos de La Niña.

Para uma justificativa adicional desta diferença examinou-se o vento zonal em dois anos de contraste, inverno de 1985, e o de 1990, apresentados nas Figura 10a e Figura 10b , respectivamente. O ano de 1985 possui a maior freqüência de bloqueios, e 1990 a menor. Nota-se nitidamente a presença do jato polar no sul da Nova Zelândia no inverno de 1985, com uma forte bifurcação do jato no sul da Austrália, característica não observada no inverno de 1990. Ressalta-se a grande importância das variações sazonal e interanual da configuração padrão do vento zonal na formação de bloqueio na região do Oceano Pacífico.

b)Desvio Padrão da Altura Geopotencial em 500 hPa

Uma importante característica que indica a presença do bloqueio, segundo Trenberth (1986) e Liu (1994), é a região de desvio padrão de altura geopotencial máxima, (z), localizada em torno de 60 de latitude.

As Figura 11a e Figura 11b mostram o desvio padrão da altura geopotencial em 500 hPa, no inverno, para os três anos de El Niño e os três anos de La Niña, respectivamente. Observa-se uma faixa estreita de máximo (Z) concentrada em torno de 60S no Oceano Pacífico, e o centro mais intenso, situado no sul da Nova Zelândia, nos anos de La Niña. Em anos de El Niño, esta faixa abrange uma área latitudinal maior (50S a 70S) com intensidade menor. Segundo Blackmon et al. (1986) e Dole (1986), a atividade dos distúrbios transientes são fracos perto do centro do bloqueio e são máximos no lado polar deste.

Para enfatizar esta diferença, apresenta-se o desvio padrão, no inverno, em dois anos de contraste, 1985 e 1990 ( Figura 12a e Figura 12b , respectivamente). Os anos de 1985 e 1990 são anos em que houve a maior e a menor freqüência de ocorrência de bloqueio, respectivamente. No inverno de 1985 ( Figura 12a ), os centros de anomalias positivas no Oceano Pacífico são mais intensos e situam-se em torno de 60S nas longitudes de 180 e 90W. Entretanto, no inverno de 1990 ( Figura 12b ), os distúrbios acompanham o vento de oeste, sem o desvio para o pólo, mostrando que neste inverno houve uma reduzida freqüência de anticiclones de bloqueio. Segundo Liu (1994), as anomalias positivas devem estar centradas em torno de 60N para estar relacionada com o fenômeno bloqueio, e que este centro é devido ao desvio do jato em direção ao pólo e assim, dos distúrbios transientes, devido à formação do anticiclone de bloqueio em torno de 50N.

Mak (1991), em um estudo sobre bloqueio, sugeriu a divisão temporal dos distúrbios transientes nas componentes de alta freqüência (1-7 dias) e componente intrasazonal (7-61 dias). A Figuras 13a e Figura 13b apresentam o desvio padrão da componente intrasazonal (7-61 dias) para três anos de El Niño e três anos de La Niña, respectivamente. Nos anos de La Niña ( Figura 13b ), há um máximo de (Z) no sudeste da Nova Zelândia. Isto mostra que a componente intrasazonal domina esta região, enquanto que, em anos de El Niño ( Figura 13a ), esse centro é fraco no Oceano Pacífico, e os centros de máximo (Z) são mais acentuados nos Oceanos Atlântico e Índico. Pode-se assim confirmar que o centro máximo de (Z) localizado ao sul da Nova Zelândia e no sul-sudeste da América do Sul estão relacionados ao desvio de jato e dos distúrbio transientes, devido à formação de anticiclones de bloqueio nestas regiões.

5-Discussão

Nigam e Lindzen (1989), Tibaldi e Molteni (1990) e DaSilva e Lindzen (1993), mostraram que a formação de bloqueio está associada com amplificação de ondas estacionárias no HN. Essas ondas são geradas por efeitos da orográfia e contraste térmico entre o continente e o oceano. Nas latitudes médias do HS, as assimétrias orograficas são mais reduzidas do que no HN, encontrando-se apenas no sul da América do Sul e no sul da Nova Zelândia. A proporção continente/oceano no H.S. é menor do que no H.N. Entretanto, as grandes massas continentais no H.S. desempenham um papel importante na localização das altas subtropicais, segundo Sinmonds e Lin (1983), enquanto que a forçante orográfica não afeta significantemente a localização destes anticiclones.

Segundo Tokioka e Noda (1986), a orografia e o contraste térmico possuem similar magnitude no HN, quanto ao papel que desempenham na geração de ondas estacionárias de grande escala, enquanto que no Hemisfério Sul, a forçante orográfica é substancialmente mais fraca do que a forçante térmica. Estas ondas, principalmente as geradas por orografia, são sensíveis a pequenos desvios do jato subtropical no HN (Nigam e Lindzen, 1989 e DaSilva e Lindzen, 1993). Com desvio desse jato para o equador, cresce a amplitude dessas ondas estacionárias, favorecendo a formação de bloqueio. Quando o desvio do jato é para o pólo, diminue a amplitude dessas ondas e prevalece o vento zonal intenso. Segundo Liu (1994), tanto bloqueio quanto vento zonal intenso nas médias latitudes são anomalias de baixa freqüência, mas com sinais opostos. A onda zonal quasi-estacionária 1, domina o campo de altura geopotencial na troposfera e estratosfera no HS (Quintanar e Mechoso, 1995a, 1995b), enquanto que as ondas zonais 2 e 3, possuem uma menor contribuição no campo de ondas estacionárias. Todavia, bloqueio atmosférico é um fenômeno essencialmente local (Mak, 1991 e Trenberth, 1986) e não pode ser representado por uma única onda estacionária, porém, por uma coleção destas. Assim sendo, através dos resultados mostrados neste trabalho, sugere-se que a variação interanual da bifurcação do vento de oeste na região da Nova Zelândia, associada com a posição do jato subtropical e do jato polar são cruciais para a variação interanual de freqüência de bloqueios nesta região. A divisão do jato de oeste pode ser vista como uma manifestação de ondas estacionárias, visto que Quintanar e Mechoso (1995b) simularam a bifurcação do jato na região da Austrália e Nova Zelândia, através de um Modelo de Circulação Geral, usado para simular a propagação de ondas estacionárias.

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